Texto de Ismail Xavier sobre o filme

Ismail Xavier é um dos maiores teóricos do cinema brasileiro, reconhecido por suas contribuições fundamentais aos estudos do audiovisual e da cultura contemporânea.

26/08/2021

“A respeito de “O Braço Direito”, apreciei o filme, e me interessou muito a opção formal através da qual a obra foi conduzida, com muita coerência e, digamos, coragem, assumindo os riscos da invenção de uma forma original para criar o clima das relações e a violência subjacente a tudo, mesmo nas situações onde prevalece a inação. “O Braço Direito” é muito original em sua forma e alcança um tratamento rigoroso na composição das cenas, no avanço de uma narrativa rarefeita que se ajusta ao teor das ações e a uma tonalidade sinistra impressa em todas as ações. Neste sentido, o diretor faz opções radicais no plano da composição das cenas e também na montagem. Gostei dos enquadramentos e do uso de planos longos em espaços naturais ou em interiores, que ganham densidade como ambientes sintomáticos do teor sinistro das relações, em última instância, representando o próprio caráter delas. Os planos, ora abertos, acentuam a distância para adensar o senso de vazio à volta da interação entre as personagens. Querem e precisam do isolamento. Ora fechados, criam um efeito de que não interessa às personagens a presença de qualquer olhar sobre elas, incluído o da câmera. Não estão disponíveis ao olhar. Uma composição, de fato, singular. Ousada. Uma curiosidade que se observa em “O Braço Direito” é a escolha de se esconder o que o filme aparentemente pretende expressar. Tempos mortos e diálogos cifrados apenas apontam para atividades de uma quadrilha que atua no mundo dos negócios – mas não revela ou aprofunda o real crime, o insider trading. O teor de violência é tratado de forma direta no trato da moça colocada à disposição do protagonista, um ramo paralelo da trama de negócios. E há a reiteração da Baixada Santista e da usina de Cubatão como indicação de que tudo que passa tem diretamente a ver com o jogo pesado das altas finanças sem que seja preciso explicitar esta relação nos diálogos. Trata-se de um excelente filme”.